Religiosidade e cultura marcam a 37ª Romaria da Terra e das Águas de Bom Jesus da Lapa (BA)
By Pastoral da Juventude - Arquidiocese de Feira - 21:37
Cerca de 6 mil pessoas estiveram presentes na 37ª Romaria da Terra e das Águas, realizada no Santuário de Bom Jesus da Lapa (BA), entre os dias 4 e 6 de julho. O evento teve como tema "Libertar a terra é defender a vida" e foi organizado pelas dioceses de Bom Jesus da Lapa, Barra, Barreiras e Irecê, arquidiocese de Vitória da Conquista, Comissão Pastoral da Terra e movimentos sociais.
A programação começou na sexta-feira, 4, com missa de abertura presidida pelo bispo de Barreiras (BA) e administrador apostólico de Bom Jesus da Lapa (BA), dom Josafá Menezes da Silva. Os bispos de Barra, dom Luiz Flávio Cappio; de Irecê, dom Tommaso Cascienelli; e o arcebispo de Vitória da Conquista, dom Luís Gonzaga Silva Pepeu, concelebraram a Eucaristia.
Cinco plenários temáticos sobre questões enfrentadas na Bahia fizeram parte das atividades do sábado, 5. Os participantes também realizaram uma Via Sacra do Santuário até as margens do rio São Francisco. Lá, fizeram o gesto concreto de coletar o lixo jogado no Cais, simbolizando a necessidade de se preservar as bacias hidrográficas e reivindicando ações mais concretas para a recuperação dos rios. Ao final do dia, uma “Noite Cultural” integrou os milhares de romeiros.
Os resultados dos debates ocorridos nos plenários temáticos foram apresentados no domingo, após a Missa da Ressurreição, na Grande Plenária. Os participantes aprovaram, ainda, uma carta sobre o evento.
Ao final do encontro, dom Josafá presidiu a celebração de envio, estimulando os romeiros a continuarem na luta nas comunidades.
Carta da 37ª Romaria da Terra e das Águas ao Bom Jesus da Lapa
“Libertar a terra é defender a vida.”
“A igreja da Lapa foi feita de pedra e luz.” Assim cantam os romeiros e romeiras no Santuário do Bom Jesus da Lapa. Nós da 37ª Romaria da Terra e das Águas, cerca de 6.000 pessoas dos vários cantos da Bahia e também de Minas Gerais, Pernambuco, Goiás, Mato Grosso, Paraná e Rio de Janeiro, tomamos deste canto popular tradicional a inspiração para comunicar às comunidades, às organizações populares e movimentos sociais, às igrejas, às autoridades e à sociedade brasileira, as pedras e as luzes que esta romaria identificou em nossa caminhada de fé e luta. Pedras de tropeço, dureza, peso, dificuldade, mas também firmeza, teimosia, resistência. Luzes que iluminam o chão da caminhada e também o horizonte da chegada, o fim do túnel, a alvorada do Reinado de Deus, que é Amor, Justiça e Paz em tudo e todos. Em cada momento de nossa romaria, da celebração de abertura à de envio, na via sacra de Cristo e do povo e do corpo do mundo, nos cinco plenarinhos temáticos, no ritual da penitência, no ofício de Nossa Senhora e no grande plenário conclusivo, perpassaram o desejo premente e o compromisso inadiável da terra livre e da vida em abundância.
Pedras. Multiplicam-se e se agravam os aprisionamentos e flagelos em que a terra e as gentes se debatem: desistência da reforma agrária e má vontade em reconhecer, demarcar e titular os territórios dos povos e comunidades tradicionais (indígenas, quilombolas, pescadores, fundos e fechos de pasto), nos cerrados, caatingas e mata atlântica; tráfico de pessoas e trabalho escravo; exploração sexual de jovens e crianças; degradação do rio São Francisco e de outras bacias hidrográficas. São consequências de um modelo de vida, de economia, de política e de sociedade, que vende a ilusão de que é capaz de combinar velhas e novas formas de crescimento incessante com garantia dos direitos humanos e da natureza, altas taxas de lucro com mínima inclusão social, expansão da produção e dos mercados com redução do aquecimento global, bancada ruralista com agricultura familiar, alimentação saudável e respeito aos territórios dos povos e comunidades tradicionais. Um modelo em franca expansão através de empreendimentos favorecidos pelo Estado, como a Ferrovia de Integração Oeste-Leste, o Porto-Sul, o Pólo Naval na Baía de Todos os Santos, a Transposição do Rio São Francisco e outros, a serviço do agro e hidronegócio, das mineradoras, dos parques eólicos, das imobiliárias. No mesmo sentido, vão os instrumentos jurídicos levados no Congresso Nacional, como Propostas de Emendas Constitucionais, Projetos de Leis e Portarias Ministeriais que tentam suprimir direitos duramente conquistados, em nome do crescimento e da exportação sem limites.
Luzes. São iluminados e iluminadores os que não se rendem e persistem na luta pela terra e pelos territórios, os movimentos e organizações sociais que não se atrelam a governos e empresas, as Comunidades Eclesiais de Base que insistem em juntar “fé e política, justiça e profecia a serviço da vida”, a infância protegida, a juventude do campo e da cidade que não se deixa seduzir pela banalidade da vida atual e os que defendem as águas e todos os bens da terra. Disse a romeira Dona Sônia, “o que a gente quer ainda não está inteiro, mas não abrimos mão da metade”. Continuamos a sonhar com o mundo liberto e a vida plena os que buscam uma educação contextualizada, a valorização do saber popular e ancestral e o diálogo e a unidade na luta dos vários movimentos e organizações do campo e da cidade.
“Não deixem a profecia morrer”, nos pedia Dom Hélder e nos repetia Dom Tomás Balduino, falecido recentemente. Animados e animadas pelo testemunho deles e tantos companheiros e companheiras fiéis lembrados nesta romaria, lutamos para reverter este processo de destruição do planeta e das vidas nele existentes, na construção de uma outra sociedade baseada em relações igualitárias, descentralização do poder e profundo respeito à natureza. Nenhum progresso é justo e desejável se o bem-estar de uns requer a exploração e a miséria de outros. LIBERTAR A TERRA É DEFENDER A VIDA!
Bom Jesus da Lapa, 06 de julho de 2014.
Fonte: CNBB e CPT Nacional
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